quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Kumpania

Para começar a falar de nosso Povo, é preciso levar em conta que somos um povo de idioma ágrafo, sendo este o nosso maior patrimônio e por mais que sejam feitas inúmeras pesquisas, pouco se pode afirmar com exatidão. Mesmo que exista um grande número de dados, uma reconstituição histórica exata que possa ser considerada como autêntica é difícil. A começar pelo nosso próprio idioma, os maiores estudiosos afirmam que a origem dos ciganos teria nascido na Índia, devido a semelhança do Sânscrito, a língua clássica indiana com o Romanê, idioma falado pelos ciganos. O Romanê, Romaí, Români ou Romani, ao longo dos tempos também sofreu influências dos locais onde os ciganos passaram e devido a isto, formaram assim inúmeros dialetos, assim sendo não há forma universal deste idioma que seja comum a todos os grupos. Na atualidade tem-se somente uma base, podendo constar muitas outras formas fonéticas que foram incorporadas por nós.
Os ciganos desde os primórdios dos tempos ficaram conhecidos por exercer atividades itinerantes como: Artistas de Circo, Vendedores de Cavalo, Comerciantes Itinerantes, Domadores, Amestradores, Ferreiros, Praticantes de Artes Divinatórias, e etc...... Hoje no mundo contemporâneo, após esta diáspora inexata, os gitanos em sua maioria, fizeram um misto de vida cigana e vida gadjé, aproveitando os melhores hábitos dos gadjés, sem nunca esquecer sua essência e sempre sendo fiel a sua religiosidade.
Na atualidade, devidos aos avanços tecnológicos que ocorreram no mundo, é também mais difícil uma vida nômade, mais ainda existe. Os ciganos em sua maioria, hoje levam uma vida normal, morando em casas, estudando (é provado que ser inculto não trás benefícios para ninguém), trabalhando, tendo acesso a internet, mais nem por isto deixa de acampar em suas férias, de exercer seus rituais, de acreditar em suas crenças.
Hoje devido a abertura que temos, encontramos muitas formas de dividir nossa cultura, ensinando nossas tradições aos que estão em sintonia com os ensinamentos do nosso modo viver cigano, fazendo uma unidade baseada no amor, no respeito e na sinceridade. Muitos gadjós que são ciganos de alma, tem se aproximado de nós, e com isto algum preconceito que existe, pelo menos no Brasil, tem diminuído consideravelmente, graças a Deus.
O povo Cigano é detentor de uma religiosidade única, veneramos vários santos, dentre os quais temos: Nossa Senhora Aparecida (padroeira dos ciganos no Brasil), Nossa Senhora da Conceição, Nossa Senhora da Luz, Santa Rita da Cássia, Virgem de Macarena (Padroeira dos ciganos na Espanha, querida e amada pelos Calons), Santa Virgem de Triana e nossa padroeira universal, a amada Santa Sara Kali, conhecida também por Virgem Sara. Esta religiosidade se encontra presente em todas as situações de nossa vida, estando presente em nossos rituais e nos ritos de passagem, que são a contagem do tempo cigano, independente do calendário tradicional.
Falsa é a idéia que o gosto pelas viagens seja o único fator responsável pelo nomadismo dos ciganos, pois na verdade, há uma longa história de perseguições e fugas.
Apenas no País de Gales os ciganos tiveram espaço para manter parte das suas tradições. Essa tolerância os levou a se sedenterizar e se misturar com a população local, dando origem aos posh-rats, ou ciganos mistos.
Na Andaluzia (Espanha), também encontraram facilidades, ocasionando sua permanência. Entretanto, durante a Inquisição Católica, vários deles foram expulsos pelos Tribunais do Santo Ofício. Não tendo direito de escolha, foram na grande maioria, enviados para Portugal, depois cruzando o mar rumo à miséria nas colônias africanas, asiáticas e americanas.
Alguns séculos mais tarde a Alemanha, sob o Domínio Nazista pretendia exterminar as raças consideradas inferiores, e entre elas estava a casta cigana. Em 1933, ano em que Hitler subiu ao poder, as restrições se tornaram mais severas. Os homens eram levados para prisões ou para os campos de concentração, enquanto que as mulheres eram vítimas das experiências realizadas pelos médicos alemães. Elas eram na maioria das vezes, esterilizadas para assim servirem de prostitutas; as que se encontravam grávidas eram cruelmente assassinadas.
Neste mesmo ano (1933), cerca de 5 mil ciganos foram deportados para Polônia. Sem as mínimas condições necessárias para sobrevivência, o frio, a anemia e a proliferação de doenças, muitos morreram, sendo seus corpos levados para crematórios coletivos.
Para justificar as perseguições e o extermínio dos ciganos, foram criadas várias lendas preconceituosas quanto à sua origem. Uma delas diz que eles são descendentes da família que negou hospitalidade à Maria e ao Menino Jesus durante a fuga para o Egito. Outra, conta que foi um cigano quem forjou os cravos com que crucificaram Cristo.
O que realmente provoca intolerância contra esse povo, é a capacidade de preservar os próprios costumes e tradições. Antigamente a forma de vivência cigana era basicamente dividida entre: Nômades - percorriam o mundo em carroções ou traillers. Semi-nômades - embora morassem em residências fixas, mantinham barracas no quintal onde se utilizavam do próprio dialeto, assim como das vestimentas tradicionais. Sedentários - aparentemente, não deixavam vestígios de sua ciganidade. No mundo contemporâneo, estas duas formas ciganas de viver, os semi-nômades e os sedentários, são as mais utilizadas pelos ciganos de diversos grupos e clãs, entrosando a dinâmica e a tecnologia do mundo gadjó com as tradições e magia, da arte cigana de viver.
O nomadismo dos ciganos foi uma das marcas que identificava o estilo de viver da raça, tendo muitos outros também como sua hierarquia e seu regime doméstico tradicional, embora muitas coisas tenham sido transformadas, até para que possamos acompanhar a evolução dos tempos. O Tribunal cigano é formado pelas nossas próprias leis ciganas, e também acompanharam a evolução dos tempos. O Kris-Romani é formado só por homens, onde deliberam sobre a questão em pauta, e resolvem os mais variados assuntos de interesse do Clã, sem que o veredicto tenha a rigidez de outrora, hoje o aconselhamento é o resultado decidido em quase 100% dos casos.
No regime doméstico tradicional, homens e mulheres têm papeis definidos. Somente a mãe pode corrigir imposturas dos filhos, as mães ensinam logo que seja possível as artes divinatórias para as meninas, e para os meninos que revelam dons. O pai ensina aos filhos homens, funções masculinas em geral e música. Hoje em tempos atuais devido ao ritmo dinâmico que vivenciamos, estas tarefas podem não ser tão definidas, mas certamente são ensinadas tanto pelo pai, como pela mãe. E ainda ambos juntamente com os avós ensinam o Romani para o tchaorrô, desde a mais tenra idade.
Os Grupos mais conhecidos são: Kalderash, Matchuaia, Louvara, Churari, Romanichal, Calon, Sinti, Rudari, Boyash, Ungaritza, Luri, Bashalé, Romungro, Xoxarai, Gurbeto e ainda existem muitos outros. Cada Clã tem seu país de origem, sua incorporação de hábitos, que influi em toda a sua cultura, sem nunca esquecer a sua base.
Naturalmente místicos, a religiosidade faz parte do total do seu dia a dia, assimilamos diversas formas de religiosidade de lugar em que vivemos sem modificar a nossa essência. Na forma cigana de enfrentar o mundo, fazem parte o medo do olho grande, na força do destino, o culto a nossos antepassados e a certeza da reencarnação.
A sexualidade é muito importante para nós, a moral dos costumes ciganos já foi mais conservadora, porém no mundo contemporâneo, os valores foram um pouco modificados diante da dinâmica da vida, hoje tanto o homem quanto a mulher tem mais poder de decisão na escolha de sua futura vida conjugal e sexual. Nos tempos antigos a cigana casava-se ainda na menarca (a primeira menstruação), os casamentos eram firmados entre dois Clãs, pelos pais e o sexo era função prioritária para se procriar, todo esse cuidado era pela continuação da raça. O casamento entre ciganos e não ciganos era totalmente desaconselhável. Hoje se existir amor e respeito pelos costumes a união é perfeitamente aceitável, os casais ciganos são discretos em público, e a maioria prefere realmente casar-se para não viver em concubinato. A esposa cigana esta sempre a cuidar de seu marido, isto é comum a todos os grupos. Quando falo destes costumes, e me refiro a mudança é generalizando, porque existem Clãs, totalmente tradicionais em seu modo de viver, mais são poucos.
A indumentária cigana, o jeito cigano de se vestir, é tradicional e foi um dos poucos costumes que sofreram poucas mudanças, apesar de hoje terem incorporado novos hábitos no tocante ao vestuário. No dia a dia, roupas mais confortáveis e comuns (na verdade, menos trabalhosas), as mulheres algumas vezes usam até mesmo jeans. Porém nos dias de festa, as gitanas exibem seus cabelos longos, seus ouros, suas saias longas, coloridas e rodadas, com decotes que mostram o colo, ficam lindos, pois elas são a mais perfeita personificação da figura cigana. Os homens gostam muito de roupas confortáveis, porém nas festas usam o bolero, geralmente de tecidos brocados, o chapéu, os ouros, as botas e o cachimbo que completam o conjunto.

Um comentário:

Cezarina Devos Macedo disse...

Minha irmãzinha querida!Adorei,como sempre teus textos,que são escritos com o coração...Quando entro no teu blog me sinto em casa,na kumpania.Te agradeço e te parabenizo pela nova forma do blog,bastante estética,embora pra mim era mais fácil ler a outra,de letras maiores...Nào sei se sabes mas sou deficiente visual e tenho dificuldade para ler textos miúdos...Mas,tenho fé que Sara vai permitir uma melhora de meus olhos!Ramona,um grande abraço gitano e bjo no teu coração!